por Arlindo Lemes 19/10/2021 às 08h42
“O custo direto do excesso de peso e obesidade foi estimado em cerca de 1,2 mil milhões de euros, aproximadamente 0,6% do PIB e 6% das despesas de saúde em Portugal”, conclui a pesquisa elaborada pelo Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (CEMBE) da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e pela consultora Evigrade-IQVIA.
Segundo as conclusões do estudo, citadas num comunicado, as doenças relacionadas com a obesidade que mais contribuem para os 1,2 mil milhões de euros de custos diretos em saúde são a diabetes, o acidente vascular cerebral, a doença cardíaca isquémica e a doença renal crónica.
“É importante realçar que o custo do tratamento destas doenças é 88 vezes superior ao custo do tratamento da obesidade `per se´, que ultrapassa os 13 milhões de euros anuais”, refere o estudo “O Custo e Carga do Excesso de Peso e da Obesidade em Portugal”, que contou com o patrocínio científico da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO) e o apoio da Novo Nordisk Portugal.
Os dados agora divulgados indicam também que aproximadamente dois terços da população adulta portuguesa (67,6%) apresentam excesso de peso ou obesidade, sendo que a prevalência de obesidade é de 28,7%.
“Em 2018, ocorreram 46.269 óbitos por doenças relacionadas com obesidade, o que representa 43% dos óbitos totais ocorridos em Portugal continental naquele ano”, refere o documento.
A carga da doença foi avaliada em anos de vida ajustados pela incapacidade, que se juntam os anos de vida perdidos por morte prematura e por incapacidade, o que permite concluir que a “obesidade em Portugal provoca a perda de 203.002 anos de vida” ajustados pela incapacidade por ano, valor que supera o número de anos perdidos por AVC.
“Para percebermos melhor a magnitude do problema, e quando olhamos para a perda de mais de 200.000 anos de vida ajustados pela incapacidade, isto significa praticamente o mesmo que retirar nove dias de vida, por ano, a cada português adulto”, adiantou Margarida Borges, a investigadora que liderou o estudo citada no comunicado.
Segundo a investigadora, estes números demonstram uma “verdadeira pandemia não transmissível e sublinham a urgência” de envolver ativamente a população na prevenção do excesso de peso e da obesidade e de assegurar um diagnóstico precoce e um tratamento adequado das pessoas que vivem com a doença.
Para Paula Freitas, endocrinologista e presidente da SPEO, as conclusões da investigação reforçam a necessidade de um “maior enfoque na prevenção, no reforço da intervenção dos cuidados de saúde primários, na abordagem multidisciplinar, no acesso equitativo ao tratamento adequado – cirúrgico e farmacológico – e à tolerância zero com o estigma e discriminação de que ainda são vítimas as pessoas que vivem com obesidade”.
A obesidade é uma DOENÇA CRÓNICA. É fundamental mudar o ‘mindset’ da sociedade em geral (e dos profissionais de saúde também…), que estigmatiza estes indivíduos. É um erro acreditar que chamar obeso é um insulto à sua dignidade. A obesidade é uma doença crónica, muito complexa e multifatorial. A gordura corporal anormal ou excessiva (adiposidade) compromete a saúde, aumentando o risco de complicações a longo prazo e reduzindo a esperança de vida. Não é – apenas – um problema estético e não resulta – apenas – do excesso de ingesta alimentar.
– A obesidade aumenta substancialmente o risco de doenças como diabetes mellitus tipo 2, hipertensão, enfarte agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, demência, osteoartrite, apneia obstrutiva do sono e vários tipos de cancro. E está, como tal, associada a elevada morbilidade e mortalidade. É difícil encontrar qualquer patologia que não seja mais prevalente no individuo obeso, ou cuja obesidade não a agrave. A Covid-19 mostrou-nos isso mesmo, com as elevadas taxas de mortalidade nestes doentes.
– Para além da sua dimensão clínica a obesidade tem ainda grandes repercussões de dimensão económica e social. Para além do impacto direto nos custos de Saúde, está ainda associada ao desemprego e à diminuição da produtividade, e assume contornos de flagelo social.
– Existem atualmente instrumentos e tratamentos farmacológicos de provada eficácia e segurança. Porém, por não serem comparticipados, o seu acesso é limitado a quem os pode pagar, e praticamente vedado aos setores mais desfavorecidos da sociedade, precisamente os mais afetados, onde é maior a incidência da doença.
Com tanta premissa, fica a mensagem:
A obesidade é uma das doenças mais prevalentes, mais subvalorizadas, menos diagnosticadas e menos tratadas da atualidade. Mais que um Problema de Saúde Pública é um Problema Prioritário de Saúde Pública!
Para o enfrentar são requeridas estratégias de prevenção, mas também de tratamento, em abordagens que combinem intervenções individuais com mudanças sociais e políticas. Abordagens que têm de envolver profissionais de saúde, mas também a sociedade civil e, naturalmente, os decisores políticos. Mas tem de ser JÁ, porque já deveria ter sido ontem!
Até quando vamos ignorar?